10 de abril de 2010

TOQUE DE RECOLHER : DE NOVO ESSA CONVERSA?


Vai começar a mesma ladainha, ou melhor, vai tornar a voar pena na Cidade Sem Limites de novo! Lá vem esse  “rebosteio” outra vez, mal tinha acabado, voltou de novo essa história de toque de recolher (a piada foi boa, mas ninguém riu, pelo menos eu não!) querendo nos empurrar goela abaixo que sem a companhia dos pais, crianças e adolescentes de até 14 anos só poderão ficar nas ruas e em locais públicos até as 20h30. Jovens de 14 a 16 anos terão que se recolher até às 22h e os que tiverem entre 16 e 18 anos terão que voltar para casa até às 23h.



Só que tem um porém nisso: pelo que todo mundo sabe, medidas como essa são apenas para locais que estão em guerra, portanto, restringir a liberdade de um indivíduo, partindo do pressuposto de que ele pode cometer uma infração, é uma arbitrariedade e atenta contra a Constituição que prevê a liberdade de ir e vir a todos os cidadãos. Além do mais, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) estabelece no seu artigo 106 a privação de liberdade somente ao adolescente que for flagrado no ato da infração. A partir de agora, sem a companhia dos pais, crianças e adolescentes da até 14 anos só poderão ficar nas ruas e em locais públicos até às 20h 30. Os jovens entre 14 e 16 anos terão que se recolher até as 22 horas e os que tiverem entre 16 e 17 anos terão que voltar para a casa até as 23 horas.Rapidamente outras cidades como Itapura e Mirassol no estado de São Paulo adotaram a medida e tantas outras começaram a debater sua implementação. A medida que visa reprimir os jovens caçando o seu direito de ir e vir foi adotada pelo juiz da Vara da Infância e da Juventude de Ilha Solteira Fernando Antônio de Lima. Somente pelo fato de um juiz legislar já fere o próprio princípio de funcionamento democrático do estado. A medida que foi implementada primeiramente em Fernadópolis, outro município do interior de São Paulo, no ano de 2005 é inconstitucional, uma vez que fere o artigo 5º, inciso XV da Constituição Federal, que diz: “É livre a locomoção no território nacional em tempos de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens.” Para atacar a juventude, eles passam inclusive por cima de suas próprias leis. A desculpa, como em outros casos, é uma suposta defesa do jovem e uma medida contra a violência. Um grande cinismo que pode ser constatado com qualquer observação sobre o estado das escolas públicas que a juventude freqüenta, por exemplo. Por detrás da retirada de mais este direito democrático da população o que os governos e a burguesia querem, na verdade, é criar cada vez mais um verdadeiro estado de sítio para impedir a livre manifestação da população contra estes governos. A própria crise capitalista que atinge em cheio o País e tem na juventude um dos setores mais atacados, tende a colocar este setor frontalmente contra o governo. A pequena cidade de Ilha Solteira, localizada no Noroeste do estado de São Paulo, está se tornando um verdadeiro laboratório de experiências para as medidas repressivas contra a juventude. Foi a partir da medida de Ilha Solteira que se espalhou por várias outras cidades a lei do toque de recolher, e é nesta cidade onde está sendo feita o maior número de prisões de jovens pela polícia por freqüentarem locais públicos depois do horário estipulado pela medida.Agora, o mesmo juiz que instituiu a lei do toque de recolher proibiu, também por meio de uma decisão judicial, que jovens menores de 16 anos freqüentem lan houses no município. A ordem determina ainda que jovens com menos de 16 anos completos não podem freqüentar lan houses em nenhum horário, nem mesmo durante o dia, nem mesmo acompanhado dos pais.



O prefeito da cidade, Edson Gomes (PP), assim que saiu a decisão, tratou de manifestar seu apoio irrestrito a ela. O mesmo fez diversos órgãos de imprensa que trataram de apontar cinicamente mais esta medida repressiva como um exemplo que deveria ser adotado em outras cidades brasileiras. É preciso denunciar esta ofensiva contra a juventude como sendo mais uma tentativa da direita e da burguesia em atacar toda a população, retirando seus direitos mais fundamentais. Portanto, essa medida é totalmente inconstitucional.



É um imenso equívoco responsabilizar o adolescente pela incompetência do Estado brasileiro na garantia dos seus direitos fundamentais. Não existe uma propensão natural da juventude ao crime. A questão está na situação degradante a qual a maior parte dos infratores é submetida ao longo de sua vida: miséria material e espiritual, ambientes insalubres, acesso aos serviços básicos de baixa qualidade como educação e saúde e presença constante da criminalidade. Nessas condições, a surpresa são aqueles que escapam da vida do crime.Até agora, ouvimos somente o Conselho Tutelar de Bauru se pronunciar contra, pelo que está de parabéns, mas até o presente momento, não se ouviu a Secretaria Municipal do Bem-Estar Social (Sebes), bem como as demais entidade desse segmento, dar a sua opinião nessa questão. A LOAS (Lei Orgãnica da Assistência Social) diz no seu Art. 2º que “A assistência social tem por objetivos:I - a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice; II - o amparo às crianças e adolescentes carentes;(...)”, ao mesmo tempo em que a Lei Orgãnica do Município de Bauru diz no seu Art. 2º que “ Constituem objetivos fundamentais do Município de Bauru: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; II - garantir o desenvolvimento municipal; III - erradicar a pobreza, a marginalização e reduzir as desigualdades sociais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, religião, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.(...)”, portanto, respeitosamente, afirmo aqui que o gestor de tal órgão municipal (a juventude e a infãncia de Bauru estão contando com você, Darlene Tendolo, não tenha medo) e o prefeito municipal, (coragem, prefeito Rodrigo! Você assumiu esse compromisso quando se elegeu!) deveriam chegar na imprensa e dizerem o seguinte( segue aqui uma dica): “Tal ação é incompatível com o tempo de democracia vivenciado em nosso país e fere a dignidade e o direito constitucional destes cidadãos e cidadãs em desenvolvimento. Quero afirmar que sou contra a política do toque de recolher e faço coro a resolução do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) que apresenta as infrações constitucionais do toque de recolher em relação aos artigos 5 e 227 da Constituição Federal e os artigos 5, 15, 16, 106, 203 e 232 do ECA” (não corre não, vereador Roque!).Traduzindo, deveriam dizer o seguinte: tal atitude é uma verdadeira baixaria!  A cidade toda está perguntando: “E agora, Mister M?” Isso aqui não é ataque, é apenas um chamado na responsa!



O toque de recolher nada mais é que uma medida paliativa e ilusória que busca tirar de foco as responsabilidades da família, da sociedade e do Estado no que diz respeito à garantia dos direitos das crianças, adolescentes e jovens. Trata-se de uma inversão de ordem, onde ao invés de garantir os direitos, retira-os para reduzir os efeitos da sua não efetivação, ou seja, uma medida acomodada do poder público que não enfrenta de frente os problemas relacionados a violência, ao trafico de drogas e a ausência de políticas públicas de juventude. Trata-se da falência do poder público local, que não consegue cumprir com a legislação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), não consegue garantir resultados e se rende frente ao avanço do trafico de drogas e ao aumento da violência, buscando retirar seus cidadãos das ruas para que não se deparem com os problemas que não conseguiram resolver. O máximo que o toque de recolher consegue externar para a sociedade é a sua concepção de juventude como etapa problemática da vida humana, ferindo o preceito constitucional que os define como sujeito de direitos. E mais, acaba esteriotipando este segmento, cujo fruto é a criminalização dos jovens, transformando todos em suspeitos de ação criminosa, principalmente os pobres e negros.



Não podemos restringir o acesso dos jovens aos espaços públicos e sim tornar saudável esses espaços, tornando-os próprios para a convivência comunitária livre de toda e qualquer mazela social contemporânea. Mais uma vez afirmo que isso é responsabilidade do Estado. Não podemos punir as crianças, os adolescentes e os jovens pela omissão histórica de nossos representantes na efetivação dos seus direitos, ainda mais sendo cruel ao ponto de dizer que é para o bem de todos, lembrando a política de segurança nacional dos anos de chumbo.



Que tal jogarmos na tranca dura, lá no Cadeião, ou mesmo em qualquer penitenciária, chamar a cana dura, discar 190  para os gestores que não efetivam os direitos dos jovens e não garantem as medidas previstas aos adolescentes infratores prescritas no ECA?

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