17 de junho de 2010

A Janela que Enxergava Diferente

O vento úmido bate no rosto do jovem de quatorze anos. Gotículas de água ficam ali em seus óculos atrapalhando a visão. Ele, na janela de seu apartamento  em  um condomínio da CDHU, bem do lado de uma favela, no décimo sexto andar, mantém o olhar fixo nas crianças que brincam lá embaixo. Parecem tão miúdas vistas lá de cima que ele sente a impressão que é capaz de esmagá-las com as mãos. Então, suspira lentamente, fecha os olhos e relaxa.

As imagens que vêm na sua cabeça são assustadoras. Quando próximas dele não são tão inofensivas quanto lá na rua brincando. Ele não consegue entender como pode ser tão diferente. Na escola riem da sua cara. As lembranças dos xingamentos e piadinhas de seus colegas fazem doer-lhe a cabeça: “Doente mental, favelado, autista,mongolóide, homossexual, maluco, veadinho, gay, perobo, boiola, bicha ”.

Revolta-se em ser ele mesmo. Coloca um pé na grade da varanda. A vontade que tem é de sentir o céu. Sentir os andares passando rapidamente por ele, pondo um ponto final nisso tudo. Não entende o porquê de tanto ódio contra ele. Era agredido por não saber jogar futebol, risadas debochadas o humilhavam quando pisava na bola e caía de cara na quadra. Dominava melhor um livro do que aquele objeto redondo. Preferia as aulas de português que as de Educação Física. Odiava ter que correr ao redor da quadra de esportes e escutar o professor o chamando de toupeira. Mas, mesmo longe dos esportes era sofrido. Durante as aulas as meninas riam dos seus óculos, o chamavam de “quatro olhos” de “lerdo”, não o deixavam estudar em paz, fazer o que ele mais gostava. Falavam que se ele continuasse assim jamais sentiria os lábios de uma garota.

Abria os olhos, colocava o segundo pé na grade da varanda, os olhos estavam cheios de lágrimas. Parecia ser menos doloroso pensar com os olhos abertos. Vinha à sua cabeça uma marcha fúnebre. Pensava nos seus CDs de música clássica também. Por que eles provocavam tantos risos? Aos seus ouvidos pareciam muito melhores que as batidas acompanhadas por erros de concordância, as quais eram tocadas por aí.

Parecia ser mesmo o fim, subia um pouco mais na grade. Queria por um término na sua existência. Ninguém no mundo deveria querer aquele que intitulavam com nomes horríveis. Só faltava dar o impulso para frente. Pela sua bochecha escorria uma lágrima. Não tinha coragem para fazer isso, descia assustado, agora teria mais um adjetivo para assombra-lo: covarde. No seu lugar caía a lagrima que se arrastava pela sua bochecha. Essa não atingiria o solo, se desmancharia no ar devido ao vento.

Encostado na parede, no canto da varanda, entrava em pânico. Pranteava muito. Era incontrolável o choro. Não entendia como a sociedade que dizia repudiar o fascismo agia pior que Mussolini.

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